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Projeto de Lei “pode gerar retrocesso para os trabalhadores assalariados e assalariadas rurais”

Em audiência pública, CONTAR faz duras críticas ao PL que pode precarizar ainda mais a situação do trabalhador assalariado e assalariada rural

Durante audiência pública realizada nesta quarta-feira (16), na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (CAPADR) da Câmara dos Deputados, o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (CONTAR), Gabriel Bezerra Santos, criticou duramente o Projeto de Lei 761/2021, que trata da facilitação da contratação temporária de trabalhadores assalariados rurais. Para a entidade, a proposta representa uma grave regressão nas garantias trabalhistas no campo.

“Esse processo pode gerar retrocesso para os trabalhadores assalariados e assalariadas rurais, pois precariza as relações de trabalho”, afirmou Gabriel. Segundo ele, o PL foi construído sem escutar os trabalhadores e trabalhadoras assalariados rurais que seriam diretamente afetados, deixando de lado o diálogo com quem vive a realidade das lavouras.

O presidente da CONTAR chamou atenção para o aumento do trabalho análogo ao de escravo no meio rural. Dados apresentados pelo presidente da CONTAR revelam que, entre 1995 e 2024, mais de 65 mil trabalhadores foram resgatados nessas condições no Brasil — 80% deles em áreas rurais. Somente em 2025, já são mais de 500 resgatados, 11 dos quais no Rio Grande do Sul.

A Confederação teme que a aprovação do projeto amplie ainda mais a precarização já intensificada após a Reforma Trabalhista de 2017 (Lei 13.467/2017). Entre os pontos mais criticados pela CONTAR estão:

  • a possibilidade de contratação intermitente no campo, considerada extremamente frágil para quem vive da renda do trabalho;
  • a ausência de jornada mínima garantida e a consequente insegurança de renda;
  • a retirada de exigência de exames médicos e normas de saúde e segurança;
  • e a eliminação do contrato de curto prazo, instrumento importante para negociações justas.

Apesar de se opor ao texto atual do PL, Gabriel reconhece que há espaço para diálogo. “Não somos contra ampliar o prazo de contratação, mas isso precisa ser feito com proteção ao trabalhador e responsabilidade com a dignidade no campo”, afirmou. O dirigente defendeu a ampliação do Plano Safra com linhas específicas para garantir alojamentos, transporte, refeitórios e outras condições básicas de dignidade.

MPT aponta inconstitucionalidade e ameaça à saúde

As críticas da CONTAR foram reforçadas pelo procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), Rafael Mondego. Embora tenha reconhecido o mérito da proposta ao tentar facilitar contratações com registro em carteira, Mondego advertiu que o PL 761 contém dispositivos inconstitucionais e potencialmente perigosos para a integridade física e psicológica dos trabalhadores.

O procurador classificou como “equivocada” e “desnecessária” a tentativa de estender o contrato de pequeno prazo para até 120 dias por ano, lembrando que já existem mecanismos legais (como o contrato de safra) que atendem à necessidade de sazonalidade no campo, sem sacrificar direitos.

Outro ponto de forte discordância é a dispensa de exames médicos e de programas de saúde e segurança, o que, segundo Mondego, fere frontalmente o artigo 7º da Constituição Federal e convenções internacionais da OIT ratificadas pelo Brasil.

“As normas de saúde e segurança no trabalho são direitos fundamentais. Não podem ser flexibilizadas ou ignoradas sob pena de retrocesso social”, alertou o procurador. Ele destacou ainda o risco de favorecimento a fraudes trabalhistas, com jornadas camufladas, pagamentos irregulares e agravamento de condições degradantes de alojamento e alimentação no campo.

Mondego também fez um alerta severo contra a adoção de trabalho intermitente no meio rural, prática que, segundo ele, aumenta a vulnerabilidade dos trabalhadores, forçando-os a longos períodos de inatividade em fazendas, longe de casa, esperando por chamadas esporádicas de serviço.

Unidade contra a precarização

O Ministério do Trabalho e Emprego, representado por três auditores fiscais do trabalho também explanou as preocupações quantos aos retrocessos que podem ocorrer caso o projeto seja aprovado. Para eles, é imprescindível garantir normas que preservem a saúde e segurança dos trabalhadores. Na ocasião também enfatizaram a importância dos fiscais do trabalho como representantes do estado brasileiro, na promoção do trabalho decente e combate ao trabalho análogo ao de escravo.

A audiência revelou ampla preocupação entre as representações de trabalhadores e órgãos de fiscalização com os rumos do PL 761/2021. Tanto a CONTAR quanto o MPT e MTE concordam que o país precisa enfrentar os desafios da contratação no campo, mas sem retroceder em direitos e proteções históricas conquistadas com luta e organização coletiva.

“A dignidade no campo passa pelo respeito à Constituição e à vida dos trabalhadores rurais”, concluiu Gabriel.

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